Silêncio nas manhãs de setembro



Neste domingo de calor infernal uberabense, vem a notícia da morte de Vanusa. Abrigada em uma casa de repouso na cidade de Santos, a cantora que convalescia de uma pneumonia que a manteve numa UTI entre setembro e outubro deste ano, faleceu devido a um quadro de insuficiência respiratória.

Nascida no interior de São Paulo, na cidade de Cruzeiro, foi aqui em Uberaba onde ela cresceu e começou na música, como vocalista em uma banda de baile/rock chamada Golden Lions. Tinha 16 anos e a junção da voz poderosa com a beleza de uma boneca não passou desapercebida; em uma apresentação da banda chamou a atenção de Sidney Carvalho, da agência de propaganda Prosperi, Magaldi & Maia, que a convidou a deixar essa currutela sem futuro, para ir a São Paulo.

E ela foi. Tinha 19 anos quando se apresentou no programa O Bom do cantor Eduardo Araújo na TV Excelsior. O contrato com a RCA veio logo, gravando seu primeiro sucesso, "Para nunca mais chorar", que abriu as portas do programa Jovem Guarda da TV Record para Vanusa. Dois anos depois daquela primeira apresentação, ela lançava o primeiro de seus 23 álbuns, Vanusa (1968).

Dos seis casamentos, os mais notórios foram com o cantor Antônio Marcos, formando um dos casais mais badalados do Brasil na primeira década dos anos 70. Mas o amor imenso, que deu a ela as filhas Amanda e Aretha não resistiu ao alcoolismo de Antônio. 

Vanusa e Antônio Marcos, fevereiro de 1972 - arquivo Folha


O outro,  com o diretor e produtor de TV Augusto César Vannucci. Augusto, (nascido em Uberaba em 1934) deixou para a musa da Jovem Guarda o filho Rafael Vanucci e uma entre várias lembranças de violência física, soco na nuca, na saída do Canecão, no Rio, após assistir a um show de Ray Conniff. Valente, também revidou várias vezes, mas nunca se deixou abater pelo desejo de dominação, fosse do pai, fosse de algum dos maridos, agentes, produtores ou contratantes. 
"Eu tenho uma filha de 23 anos, a Aretha, que resolveu ter uma filha sozinha. Não quer casar. Porque se ela tivesse casado com o pai da filha dela ele ia impedir que ela trabalhasse. Eu me casei sete vezes e larguei todos os meus maridos por causa do mesmo motivo, eles queriam que eu parasse de trabalhar. Se a mulher trabalha, tem mais dinheiro que ele, mais sucesso que ele, dançou. Estou para conhecer homem que lida bem com isso." (Entrevista para a revista Isto É, edição de 03/11/1999)

De Vanusa guardo "Manhãs de Setembro", composição sua de 1973, a interpretação de "Paralelas" de Belchior, a gratidão em "Um abraço pro Chico", mas principalmente a força. Nunca consegui ver o vídeo da apresentação em que ela erra a letra do Hino Nacional, jamais aceitei vê-la tão fragilizada, alvo de chacotas.


Mesmo forte e determinada, Vanusa sucumbiu à depressão por um longo período, que a levou a dependência de remédios e álcool. Entre outros problemas de saúde, desenvolveu síndrome demencial. Em agosto desse ano, sua filha Aretha tentou uma vaquinha para comprar uma casa para a mãe.

"Minha mãe não tem mais cognitivo (que significa a perda da memória e dificuldade de raciocinar. Ela assistiu a minha reportagem na TV (falando da campanha para a casa própria) e não entendeu nada. Não tem mais como conversar com ela. Minha mãe se tornou uma criança, que às vezes fica brava. Ela merece uma vida maravilhosa. Não interessa que ela não saiba que eu sou a filha dela. Eu sei que ela é minha mãe". (entrevista de Aretha para o Jornal Extra de 11/08/2020)
No sábado, 07 de novembro Amanda, sua filha mais velha esteve com ela na casa de repouso. Conversaram, passaram horas felizes juntas. A dor, as decepções,  as lutas, tudo que rasgou a alma dessa mulher em pedaços ficou pra trás. A morte lhe foi leve e agora ela está em paz.


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